Aviso: Essa resenha contém spoilers da terceira temporada de Yellowjackets
Por Manuela Almeida
A terceira temporada de Yellowjackets mergulha ainda mais fundo no terror psicológico, nos dilemas morais e nas consequências irreversíveis do trauma coletivo. Após o chocante desfecho da segunda temporada, a série retorna mais ousada, intensificando os elementos sobrenaturais e explorando o colapso emocional de suas protagonistas com densidade narrativa e uma atmosfera sufocante. Com atuações notáveis e uma trama cada vez mais sombria, Yellowjackets reafirma seu status como uma das séries mais impactantes da TV contemporânea.

🏕️ Linha do passado: a floresta como entidade
Nos anos 1990, o grupo de adolescentes enfrenta o auge do inverno e o esgotamento físico e emocional. A morte de Javi e Jackie catalisa uma divisão irreparável entre as garotas: algumas ainda se apegam ao suposto poder místico da floresta, enquanto outras apenas lutam para manter a sanidade.
Shauna, cada vez mais fria, assume uma liderança pragmática, marcada por decisões brutais e um crescente distanciamento emocional. A canibalização se transforma de tabu em ritual – não mais por desespero, mas como parte de uma nova ordem moral. Misty, antes subestimada, ganha espaço como manipuladora silenciosa. Já a floresta deixa de ser um cenário e se impõe como uma entidade simbólica e ameaçadora.


🏡 Linha do presente: o legado da floresta
No presente, as sobreviventes enfrentam as consequências emocionais e sociais dos eventos do passado — agora catalisadas pela morte de Natalie, publicamente atribuída a uma overdose. Lottie, profundamente abalada, é internada em um hospital psiquiátrico, onde continua a experimentar visões inquietantes, supostamente conectadas à “entidade da floresta”. Suas alucinações lançam dúvidas sobre o que é delírio e o que pode ser interpretado como manifestação de algo muito mais antigo e sinistro.
Misty, até então tida como estrategista fria, começa a perder o controle emocional, especialmente após confrontos com a mãe de Crystal — a jovem que ela acidentalmente matou no passado. O segredo, há tanto tempo enterrado, ameaça vir à tona, e a paranoia se instala com força no grupo. Taissa, por sua vez, se aprofunda no mistério da “outra personalidade” que a atormenta desde a juventude. Sua investigação a leva a um historiador excêntrico que apresenta evidências da existência de uma seita ancestral, possivelmente conectada à mesma força que habita a floresta. A ideia de um ciclo repetitivo – de eventos, mortes e sacrifícios – começa a se formar, sugerindo que elas não foram as primeiras a serem tocadas por esse fenômeno.
A morte de Lottie Matthews em Yellowjackets marcou profundamente o público por seu caráter inesperado e trágico. Após a queda de seu retiro espiritual e a perda de Natalie, Lottie foi morar com Shauna e sua filha Callie. A convivência gerou tensão, culminando em um confronto que levou à morte de Lottie pelas mãos de Callie. O segredo foi mantido por um tempo até ser revelado a Jeff, que decidiu proteger a filha. A revelação teve um forte impacto emocional em Shauna, que passou a encarar as consequências do passado e sua influência sobre Callie.
Um dos momentos mais importantes e impactantes da temporada é a morte de Van, uma personagem amada pelo público, sacrificada em uma disputa ritualística manipulada por Misty, e por outro lado, Shauna Shipman sempre com o seu dedo em cenas de morte. A cena, tanto gráfica quanto emocionalmente devastadora, marca o ápice da degradação moral do grupo. A floresta, cada vez mais personificada, deixa de ser um mero cenário hostil para assumir contornos de uma força viva, invisível e faminta, alimentada pelas crenças e pelos temores das meninas. Visões simultâneas, fenômenos inexplicáveis e comportamentos ritualísticos sugerem a presença de um elemento sobrenatural que transcende a alucinação coletiva.
Com a escalada do caos emocional e a deterioração moral do grupo, os laços de amizade entre as sobreviventes juvenis se tornam cada vez mais frágeis — substituídos por alianças circunstanciais e uma tensão latente constante. Nesse ambiente onde a confiança é uma ilusão e a sobrevivência exige decisões cada vez mais radicais, surge um arco narrativo inquietante: Misty e Taissa, em momentos distintos, mas complementares, passam a considerar a possibilidade de matar a Shauna para que ela não seja a única Yellowjackets restante, pois sabem da capacidade de sua “amiga”.


💥 Episódio final: presságios e continuidade
O desfecho da temporada entrega uma experiência emocionalmente devastadora e narrativamente provocativa. No passado, o grupo rompe completamente com os resquícios de civilidade, abraçando um novo e sombrio código moral. No presente, Shauna descobre um diário inédito deixado por Natalie, que sugere que a entidade da floresta ainda age por meio das sobreviventes – exigindo, inclusive, novos sacrifícios para impedir um mal maior.
A temporada se encerra com um gancho poderoso: a misteriosa e repentina desaparição de Callie, filha de Shauna, em uma floresta próxima à residência da família. A implicação é clara – o ciclo continua, agora ecoando em uma nova geração, como se a própria floresta tivesse escolhido uma nova portadora.
🧠 Conclusão
A terceira temporada de Yellowjackets é densa, perturbadora e narrativamente ambiciosa. Equilibrando com precisão o horror físico e o simbólico, a série mergulha na degradação da psique humana diante da fé cega, do medo e do instinto de sobrevivência. As atuações continuam impecáveis, com destaque para Melanie Lynskey, Christina Ricci e Simone Kessell. Mais do que uma temporada, este é um capítulo visceral de uma história que se recusa a oferecer respostas fáceis — e justamente por isso, tão fascinante.

